domingo, fevereiro 28, 2010

Dr. Diniz, Meu Pediatra

MARCUS ARANHA

Diária e pacientemente, examinava os recém nascidos, um por um.

Nasci no ano de 1942, ainda no período da Segunda Guerra Mundial. Contava minha mãe que eu gozava de boa saúde, mas, vez ou outra havia de me levar a um pediatra. Ou para seguir o meu crescimento, ou por causa de pequenas mazelas dessa primeira infância.

Esse meu primeiro médico tinha consultório no Ponto de Cem Réis, num primeiro andar, sobre a farmácia de “Sêo” Teixeira, mais ou menos, hoje, onde é a loja King Jóias.

Chamava-se Francisco da Costa Diniz.

O Dr. Diniz cuidou de mim até ficar taludinho. Dizia minha mãe que ele, como outros médicos da época, ainda formulava. Ou seja, receitava a fórmula do remédio que indicava ao pequerrucho doente, pozinhos que “Sêo” Teixeira preparava e colocava em papelotes. A mãe da criança dissolvia em água e administrava com uma colherinha ou numa chuca.

E com essa terapia leve eu comecei a viver

Em 1945, inauguraram a Maternidade Cândida Vargas e Dr. Diniz foi o primeiro pediatra dela. Naquela época havia até um certo “romantismo” no berçário, cujos berços possuíam cortinados, com fitinhas azuis ou cor de rosa, conforme o ocupante dele fosse menino ou menina. Na velha maternidade de Jaguaribe, anos e anos, Dr. Diniz, diária e pacientemente, examinava os recém nascidos, um por um. Até aos 70 anos ele trabalhou na Cândida Vargas.

Quando pensaram o Instituto de Proteção a Infância junto com o Hospital São Vicente de Paula, o Dr. Guedes Pereira e o Dr. Diniz foram seus fundadores. O Instituto destinava-se a dar assistência médica às crianças carentes. O Hospital tinha como objetivo gerar recursos para manter o primeiro.

Pois, desde a fundação, Dr. Diniz estava lá atendendo gratuitamente, todos os dias, as crianças que estavam internadas. Além disso, realizava o atendimento num ambulatório onde a sala de espera vivia cheia todos os dias da semana.

Houve uma época em que os dirigentes do Instituto quiseram contratá-lo como médico, com a carteira assinada, salários, férias e outras vantagens. Ele recusou peremptoriamente, alegando que o compromisso dele com o Dr. Guedes Pereira, ao fundar a instituição, foi de que ele atenderia até quando pudesse, gratuitamente, aos pequeninos. E que ele ainda podia fazer assim... Fez finca pé e ninguém conseguiu demovê-lo da idéia. E aos 80 anos de idade medicava gratuitamente as crianças do Instituto.

Foi assim o trabalho médico voluntário de amor a criança, exercido pelo Dr. Diniz durante décadas. Acredito que a religiosidade evangélica protestante que possui e professa, o mantinha incansavelmente apegado ao trabalho médico de sempre cuidar de crianças.

Dono de um vigor extraordinário, o vi muitas vezes, já em idade avançada, na direção de um jipe Willys, capota de aço, sem muitos confortos, sem direção hidráulica e sem câmbio automático. Nunca soube de divertimentos mundanos praticados pelo Dr. Diniz; diziam-me que gostava de criar cachorros de raça e passarinhos.

No começo da década de 90 assumi a direção da Maternidade “Cândida Vargas” e senti que apesar esse trabalho magnífico em prol da infância de João Pessoa, nunca ninguém havia lhe feito uma homenagem, coisa mais que merecida.

Achei que era meu dever providenciar uma homenagem ao meu pediatra. Por força de Lei aprovada na Câmara Municipal e sancionada pelo Prefeito Carlos Mangueira, à ala dos recém nascidos na “Cândida Vargas” denominei “Berçário Francisco da Costa Diniz”, a mais humilde das honras a quem tanto fez na pediatria da Paraíba.

No último dia 10 de fevereiro Dr. Diniz completou 100 anos. Os filhos dele me mandaram um convite para uma comemoração, ao qual eu não pude atender em razão de doença. No teor do convite, as palavras sábias do Dr. Diniz: “Guardo a vitória alcançada em poder desfrutar meus 100 anos vividos em bom gozo. Perto de todos e distante de tudo. É assim que a benevolência imprime sua força e sabedoria”.

Hoje viajo a São Paulo para, durante semanas me submeter a drogas anticancer aplicadas nas veias. Já não é possível, como em 1942, recorrer ao Dr. Diniz...

Com essa quimioterapia muito pesada eu vou tentar continuar a viver.

2 comentários:

Edinaldo Chaves disse...

Caríssimo! Lendo a homenagem que fazes ao Dr. Diniz, tomo conhecimento de tua luta, é difícil é mais é possível encontrar dentro de nos uma força maior capaz de fazer milagres, sei que tens e a encontraras e ela há de te mostrar que sempre que sentir-mos o peso da dor e o sol parecer nunca nascer apesar da fúria do mar exatamente nessa hora começará o refluxo da maré. Com certeza haverás de vencer essa luta e chegarás a exemplo de teu mestre a comemorar data tão festiva. Abraços Edinaldo P. Chaves

Alexandre Diniz disse...

Apos um ano do ccomentario feito pelo Dr.Marcus Aranha, sobre meu avo hoje comemoramos mais uma vez seus 101 anos de vida e em memoria do Dr.Marcus fazeremos um breve minuto em sua lembrança e dedicaçao.