sábado, março 26, 2011

A Novela Araguaia, e o Oba Oba da Esquerda Festiva

'Hugo Caldas

Uma constatação lamentável. A novela "Araguaia", para usar as palavras de Lalau Ponte Preta, mentor deste Blog, está caminhando para o perigoso terreno da galhofa. Agora, na sua reta final o folhetim tomou ares de arauto da propaganda enganosa e se me permitem, abusiva até. Refiro-me aos lamentáveis feitos, efeitos e defeitos da guerrilha que por aquelas bandas prosperou nos anos de chumbo. Tenho o maior respeito e apreço (para usar a palavra da moda neste último fim de semana) por àqueles jovens desavisados, idealistas por excelência, que embarcaram no barco furado da aventura. Seja por patriotismo, seja por ignorância.

Artistas, assim como jornalistas são formadores de opinião. É triste para não dizer grotesco, ver um ator do quilate de Juca de Oliveira, se dizer o tempo todo "comunista, graças à Deus" ou recitar versos de Pablo Neruda ressaltando a condição esquerdista do poeta. É penoso assistir ao seu esforço para interpretar um ex-guerrilheiro neurótico, com medo de tudo e de todos. O Otavio Augusto então, como um padre... o Nelson Rodrigues se vivo fosse diria que ele seria um bom padre de passeata, ou um Frei Betto da vida, uma coisa mais antiga do que o Farol de Alexandria.

Nos meus tempos de adolescente, tínhamos como vizinho, um sargento neurótico de guerra, que havia servido no Regimento Sampaio, na tomada de Monte Castelo, na Itália. Lá, o pobre homem ouviu tantos tiros, tanta explosão, viu tanta gente morrendo, sofreu tanta tensão que criou dentro de si um medo irreprimível, uma neurose desmesurável. Qualquer barulho fora do normal era motivo para ele berrar ordens e gritar em plena madrugada, acordando a vizinhança, conclamando todos a pegar em armas para matar uns alemães que estariam na esquina da Av. Epitácio Pessoa.

Que me desculpem os amigos do Cordão Encarnado por recorrer mais uma vez ao assunto.

Pois é, qual o jovem, pelo menos os da minha geração, que não se entusiasmou com as idéias do socialismo? Eu mesmo vibrei com a Revolução Cubana. Achava Fidel e seus barbudos os herois do povo cubano, coisa que eles eram na realidade, logo após descerem da Sierra Maestra. A minha desilusão não tardou a acontecerr. Foi quando Fidel declarou ao mundo o "caráter socialista" da revolução enquanto mandava ao "paredon", atenção vocês aí da geral, nada a ver com os BBB's da Globo. Era o pelotão de fuzilamento, mesmo. Quando o Tio Sam reclamou que Cuba estava matando muita gente ele retorquiu que só se saneava "matando a los ratones" mas sugeriu uma oportunidade de escambo para os mesmo ratones. Pouparia as suas vidas de bom grado se os EEUU enviassem tratores para a ilha.

Salvo melhor juízo, os acima referidos desavisados e idealistas ignoravam os crimes cometidos por Josef Stalin. Crimes que foram denunciados por Nikita Khrutchev, durante o 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética, em 1953. Crimes que foram muito bem resguardados e escondidos de todos pelos Partidos Comunistas do mundo inteiro.

Aqui, à guisa de informação, alguns desses tenebrosos eventos:

Os expurgos, as deportações em massa, o trabalho forçado nos Gulags e os fuzilamentos mataram algo em torno de 20 milhões de russos só na antiga União Soviética até 1953, ano da morte do tirano. Na Polônia, 22 mil oficiais do exército foram executados na floresta de Katyn, na primavera de 1940. Hoje, após anos a culpar os nazistas pelo massacre, finalmente a verdade veio à tona. Em 1990, a própria Rússia reconheceu que Josef Stalin e seu chefe de polícia Lavrentiy Beria foram os responsáveis. Porém o mais cruento de todos eles foi a eliminação de Leon Trotski, criador do exército vermelho e desafeto pessoal do ditador.

Expulso da URSS, Trotski se asilou na casa do pintor Diego Rivera no México. Certo dia por lá apareceu um espanhol "herói" da Guerra Civil Espanhola, que servindo como agente da NKVD, polícia secreta nos moldes da Gestapo nazista, se tornou famoso por cumprir uma "tarefa do partido". Assassinou Leon Trotski, enterrando-lhe uma picareta de alpinista na testa. O nome desse infeliz tarefeiro: Jaime Ramón Mercader del Río Hernández.

Acredita você que se os guerrilheiros do Araguaia tivessem conhecimento dos crimes de Stalin a guerrilha teria acontecido? Difícil qualquer conjectura. Ainda hoje há quem diga tratar-se de mentiras e intrigas da direita decadente.

Mas, voltando à novela. A trama afrouxou, atravessou, como nas Escolas de Samba, não obstante tantos escritores capitaneados pelo Walther Negrão que já nos deu outros folhetins bem mais interessantes. É como sempre diz a Tia Nenen: "panela que muitos mexem sai insossa ou salgada". Não seria talvez, alguma tarefa do partido para bajular os poderosos de plantão? E, coisa mais antiga ainda. A dicotomia direita x esquerda. O nós e eles. O bem e o mal. Nós somos o bem, eles são o mal. Ah façam-me o favor! Nesse final da novela, todos são "do bem", ou seja, da esquerda. Há apenas um grande malvado, na direita, evidentemente. O personagem Max Martinez, interpretado por Lima Duarte. Coitado do Ariclenes Venâncio. É tudo de ruim que se pode imaginar na face da Terra. Malvadezas mil, criminoso frio, que para receber o dinheiro de um seguro não hesitou em explodir uma mina com os operários dentro, trabalhando. Asqueroso personagem sempre às voltas com um importuno e estéril sotaque "gauchês por supuesto, no más"! Até lhe arranjaram um "chapéu de touro". Estão longe os tempos em que ele, como Lázaro Venturini, em outra novela, dizia para Zilda Cardoso - Dona Catifunda sua enfermeira, com a língua engrolada pelo derrame, "eu quero melão". E finalmente: onde se poderia imaginar um casal em plena lua de mel se dar ao prazeroso ofício de uma pescaria? Com aquela mulheraça pra 300 talheres, não teriam os pombinhos algo mais interessante a fazer do que pescar piabas?

O triste é constatar hoje que o país perdeu a graça. Ficou pobre. Emburreceu. Araguaia - a novela, convenhamos, virou bagunça! Uma pena.

5 comentários:

Jorge Zaupa disse...

Hugo, simples, objetivo e claro.
Pena que vc.não dê retorno financeiro à ''poderosa''.

Dorival Maia disse...

Professor Hugo
Assim também já é demais. Tenha dó pelo menos de seus antigos alunos
"esquerdinhas". Mas no fundo Eu gostei. Saudades do Dorival

Girley Brazileiro disse...

Amigo Hugo,

Adorei seu post de hoje. A Historia de Cuba/Russia sempre me seduz. E a novela não tenho opinião, pq não assisto.Ma, imagino o que pode ser. Isto sempre ocorre nas novelas da TV.

Meu abraço Girley

Unknown disse...

A propósito do tema Hugo...

Quando nem as mentiras e nem as verdades são nobres.

Uma sociedade que escolheu “organizar-se” através de um Estado com regime democrático precisa aprender a conviver e respeitar os acordos que faz... ...o que se deveria trazer a discussão, como valor contributivo à história, seriam os verdadeiros fatos e motivos e os “supostos erros e acertos” que “as partes” não tiveram... Ou tiveram?...

Transcorrerão dezenas, talvez uma ou mais centena de anos para que sejam entendidas as verdadeiras causas e consequências da "Ditadura Militar", mas mesmo assim se suas verdades e mentiras forem inseridas no real contexto em que ocorreu o que só acontecerá sem o lateralismo das paixões e quando amainarem os sentimentos revanchistas: de dor pela derrota, do júbilo pela vitória ou “conquista” que não houve, pois só houve perda...

Mas mesmo com o passar desse inexorável tempo é possível que nunca venhamos saber o verdadeiro lado das verdades e das mentiras que hoje se confundem na covardia do anonimato, mas por quê? Porque, nesse caso, nem as supostas verdades e mentiras são nobres; ambas podem ter causado júbilo e dor, mais ainda é “rescaldo” de uma batalha entre irmãos, pois sempre se soube que não haveria vencedor e se confirma agora...

Carlos Mello disse...

Muito boa. Ainda hoje conversei sobre isso com meu amigo Jacozinho. A merda é que há gente escrota e violenta em todo lado, acho que a humanidade está em liquidação, talvez para dar lugar a uma outra. Para todo lado que v. se vira só vê violência, injstiça e sacanagem. Não vejo absolutamente nenhum diferença entre esquerda e direita. Entre Stalin e Hitler ou, em ponto menor, entre Fidel e Pinochet, a diferença é a cor da bandeira. Cada vez quero falar menos sobre esses assuntos. Como diz o Jacó, "meu cardiologista proibiu."Carlos