quarta-feira, setembro 21, 2011

Sobre o "O Ensino da Língua Portuguesa"

Texto de uma carta de Régis Meney - romancista e teatrólogo francês, sobre o artigo, "O Ensino da Língua Portuguesa", de Clemente Rosas.

Salve, Clemente,

E obrigado pelo seu artigo sobre a qualidade da língua a preservar. É uma questão autenticamente política, a que v. trata aí. O perigo contra o qual v. alerta com toda razão concretizou-se na Inglaterra, há alguns anos. O problema se apresentou com certa acuidade pelo fato da presença de numerosos imigrantes. "Professores" puseram na cabeça que seria mais "justo" e mais respeitoso para essas comunidades ensiná-las no seu próprio jargão, ou "patuá", tal como é falado nos ghettos jamaicanos, indianos ou paquistaneses da Inglaterra. Nos Estados Unidos, movimento semelhante nasceu para promover o uso do "ebonics" e uma séria controvérsia se seguiu a isso. Decididamente, encontramos as mesmas neuroses ideológicas nos esquerdistas do mundo inteiro!

O resultado dessa concepção falsamente esclarecida mas autenticamente ignorante das realidades da vida: os garotos assim formados viram-se, ao sair da escola, incapazes de obter um emprego, sendo quase analfabetos. Os "fazedores do bem" bem pensantes os haviam condenado ao desemprego. Os primeiros a se queixar dessa demagogia estúpida foram os pais: eles haviam compreendido que haviam metido suas crianças em um saco sem fundo cultural (e econômico, por via de consequência) . Isto é o "politicamente correto enlouquecido", como se diz.

Mas é tão chique, tão inteligente, tão moderno quebrar os códigos, subverter as tradições! A ortografia? A sintaxe? O vocabulário? Constrangimentos ultrapassados, velharias reacionárias que contrariam a liberdade e a identidade desta bela juventude!

Eu falaria mais alto das realidades da vida: eis aí uma noção que faz rir nossos esquerdistas e pretensos intelectuais - eles que só juram pela utopia e se banham na abstração irresponsável. A esse propósito, v. já observou o desprezo que os intelectuais muitas vezes dedicam aos provérbios (que chamamos a "sabedoria das nações", pelo fato de constituirem um somatório de experiências incontestável)? Esses pobres provérbios enfrentam seu desprezo porque são muito próximos do real - e muito extranhos às quimeras que deleitam sua vaidade intelectual, afastando suas angústias.

No Brasil vocês dizem com razão: Quem não se comunica se trumbica! Se ensinamos às crianças a comunicar-se apenas com seus semelhantes, fechamos-lhes o acesso ao elevador social e favorecemos uma espécie de "comunitarismo anti-republicano".

Eis aí, portanto, um combate útil, digno do Iluminismo! Abraços. Régis.

Observação de Clemente Rosas: O Régis não é nenhum direitista, como pode parecer. É de uma família de esquerda - o pai foi militante importante do PCF - apenas desencantada com os desmantelos da URSS e do "socialismo real", e mantendo uma postura crítica em relação às últimas e variadas ondas de "esquerdismos".

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