terça-feira, agosto 28, 2012

Tiro&Queda

Eduardo Almeida Reis
   
Recuerdos – Morrendo de malária, perguntei ao doutor Aldemir Negrão Martins, professor de doenças tropicais na UFJF, que me assistia em Juiz de Fora: “Existe sensação pior do que esta?”. E ele, às voltas com o termômetro e as pílulas de quinino feitas numa farmácia suburbana: “Existe. Pedra nos rins”.

Michel Eyquem de Montaigne padecia de cálculos renais, assim como Pierre de Montaigne, seu pai. Consta que o atual ultrassom alivia grande parte dos casos. Ainda assim, não é coisa que ninguém queira experimentar. Dia desses, excelente amigo aqui do jornal andava às voltas com uma pedrinhas. Ficou bom e provou ao mundo que a felicidade existe. Como? Embarcou num avião em Confins, MG, pousou em Alta Floresta, MT, e foi pescar com seis amigos na divisa do Mato Grosso com o Pará.

Aí é que está: ao contrário do que se diz, a felicidade existe num rio que ninguém conhece, uma semana inteira pescando, bebendo e fumando charutos – meu amigo levou 25 cubanos –, na divisa com o MT com o PA. Andei por lá no século e no milênio passados, mas a trabalho. Sofri o diabo. Onze malárias e o mais que o leitor possa imaginar. Semanas inteiras movido a cerveja e ovos cozidos, dieta de pioneiros idiotas. Ovo cozido tem casca. Você tira a casca e o de comer está limpo. Banhos tomados em rios infestados de piranhas e candirus.

Como ninguém conhece o candiru, aqui vai a explicação: designação comum aos peixes teleósteos siluriformes das famílias dos tricomicterídeos e cetopsídeos, geralmente de distribuição amazônica, hematófagos, capazes de parasitar as brânquias de outros peixes e penetrar em orifícios naturais de animais e da espécie humana, podendo causar ferimentos graves e até a morte.

O leitor sabe perfeitamente quais são os orifícios naturais da espécie humana. E o imbecil, à beira do rio, tomando banho de cuia, não raras vezes à noite, na vã tentativa de enriquecer. Cês querem saber de uma coisa? Bom mesmo é viver de escrever para fora.

Fuga do verde –
Bela matéria de Flávia Ayer, publicada neste caderno Gerais, tratou do pessoal que troca o verde dos condomínios do entorno pela selva de pedra chamada Belo Horizonte. Culpa do trânsito. Condomínios que demoravam 15 minutos do BH-Shopping, hoje pedem uma hora de automóvel quando tudo corre bem. E o BH-Shopping, a exemplo da Cidade Administrativa Presidente Tancredo Neves, não fica propriamente em Belo Horizonte.

Flávia Ayer – que em espanhol quer dizer Flávia Ontem, enquanto em inglês seria Flávia Yesterday e em alemão Flávia Gestern – entrevistou inúmeras famílias vindas do verde para a cidade, não porque desgostem dos ares, das matas e dos climas condominiais, mas porque não querem passar três horas na estrada todo dia, no que obram muitíssimo bem.

Tempos atrás, um executivo da Globo, que morava em Nova Ipanema, na Barra da Tijuca, e trabalhava na Praça XV, centro do Rio, se queixava de “trabalhar seis dias por semana para o doutor Roberto”, cinco na empresa e um no trânsito.

Contratou motorista e logo se arrependeu. A proximidade no carro “obriga” o patrão a conversar com o cinesíforo, como constatou Edward Hall em seu admirável The Hidden Dimension, que obviamente li em português. Dirigir ao menos uma hora de volta para casa complicava a vida do executivo, que é dado ao consumo de bebidas alcoólicas. Em sua casa da Barra passei bela manhã ao som de um presunto de Parma fatiado na hora e múltiplo Dom Pérignon em flute de cristal. É aquela história: em podendo, me trato.

E vou mais longe: trabalhando em domicílio, vosso philosopho poderia morar num condomínio, com a só condição de que o clima fosse quente. Afinal, duas horas de carro duas vezes por semana, para comprar gulodices no supermercado chique, visitar o banco e os amigos do jornal, seriam perfeitamente suportáveis.

Bem que tentei quando me mudei para a capital de todos os mineiros, mas acabei caindo próximo da Favela do Cafezal, a quinze metros de um point de venda do branco e do preto, leia-se cocaína e maconha, que nunca experimentei.

O mundo é uma bola –
27 de agosto de 1810: explode parte de Almeida, em Portugal, destruindo a catedral, o castelo, as defesas da cidade, matando mais de 500 soldados luso-britânicos e permitindo a invasão francesa. Só agora tomei conhecimento de uma Almeida em Portugal. A julgar pela explosão que permitiu a invasão do país, concluo que a cidade fique na fronteira. Vou ver e volto já. Fui: tem brasão, bandeira e fica na fronteira com a Espanha. Pertence ao Distrito da Guarda, região Centro e sub-região Beira Interior Norte. Tem 1.300 habitantes, poucos mais que a Serra da Saudade, MG. Em 1828 o Brasil reconhece a independência do Uruguai para alegria do atleticano don Francisco Tomás Mesquita. Em 1955 é lançado o livro Guinness dos Recordes como brinde aos consumidores da cerveja Guinness, que já tomei e não gostei.

Hoje é o Dia do Psicólogo.

Ruminanças – “Divertido no casamento com uma psicóloga é que ela não se apaixona por você, mas pelo caso clínico” (R. Manso Neto).

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