sexta-feira, janeiro 10, 2014

O PERIGO VERMELHO

Arnaldo Jabor


É necessário alertar a população pensante para essa mediocridade ideológica anacrônica e fácil para cooptar jovens sem cultura política.

Retiraram o corpo de João Goulart da sepultura para examiná-lo. Coisa deprimente, os legistas examinando ossos de 40 anos atrás para saber se foi envenenado. Mas, havia também algo de um ritual de ressurreição encenada. Jango voltava para a turma que está no poder e que se considera vítima de 1964 até hoje. Só pensam no passado que os “legitima” com nostalgia masoquista de torturas, heranças malditas, ossadas do Araguaia, em vez de fazerem reformas no Estado paralítico e patrimonialista.

Querem continuar a “luta perdida” daqueles tempos ilusórios. Eu estava lá e vi o absurdo que foi aquela tentativa de “revolução” sem a mais escassa condição objetiva. Acuaram o trêmulo Jango, pois até para subversão precisavam do Governo. Agora, nossos governantes continuam com as mesmas ideias de 50 anos atrás. Ou mais longe. Desde a vitória bolchevique de 1921, os termos, as ilusões são as mesmas. Aplica-se a eles a frase de Talleyrand sobre a volta dos Bourbons ao poder: “Não aprenderam nada e não esqueceram nada”.

É espantosa a repetição dos erros já cometidos, sob a falácia do grande “teólogo” da História, Hegel, de que as derrotas não passam de “contradições negativas” que levam a novas teses. Esse pensamento justificou e justifica fracassos e massacres por um ideal racional. No PT e em aliados como o PC do B há um clima de janguismo ou mesmo de “brizolismo”, preferência clara da Dilma.

Brizola sempre foi uma das mais virulentas e tacanhas vozes contrárias ao processo de desestatização.

Mas, além dessas mímicas brasileiras do bolchevismo, os erros que querem repetir os comunistas já praticavam na época do leninismo e stalinismo: a mesma postura, o mesmo jargão de palavras, de atitudes, de crimes justificados por mentiras ideológicas e estratégias burras. Parafraseando Marx, um espectro ronda o Brasil: a mediocridade ideológica.

É um perigo grave que pode criar situações irreversíveis a médio prazo, levando o país a uma recessão barra pesada em 2014/15. É necessário alertar a população pensante para esse “perigo vermelho” anacrônico e fácil para cooptar jovens sem cultura política. Pode jogar o Brasil numa inextrincável catástrofe econômica sem volta.

Um belo exemplo disso foi a recusa do Partido Comunista Alemão a apoiar os socialdemocratas nas eleições contra os nazistas, pois desde1924 Stalin já dizia que os “socialdemocratas eram irmãos gêmeos do fascismo”. Para eles, o “PSDB” da Alemanha era mais perigoso que o nazismo. Hitler ganhou e o resto sabemos.

Nesta semana li o livro clássico de William Waack “Camaradas”, sobre o que veio antes e depois da intentona comunista de 1935 (livro atualíssimo que devia ser reeditado), e nele fica claro que há a persistência ideológica, linguística, dogmática e paranoica no pensamento bolchevista aqui no Brasil. A visão de mundo que se entrevê na terminologia deles continua igual no linguajar e nas ações sabotadoras dos aloprados ao mensalão — o fanatismo de uma certeza. Para chegar a esse fim ideal, tudo é permitido, como disse Trotsky: “a única virtude moral que temos de ter é a luta pelo comunismo”. Em 4 de junho de 1918, declarou publicamente: “Devemos dar um fim, de uma vez por todas, à fábula acerca do caráter sagrado da vida humana”. Deu no massacre de Kronstadt, em 21.

No Brasil, a palavra “esquerda” continua o ópio dos intelectuais. Pressupõe uma “substância” que ninguém mais sabe qual é, mas que “fortalece”, enobrece qualquer discurso. O termo é esquivo, encobre erros pavorosos e até justifica massacres. Temos de usar “progressistas e conservadores”.

Temos de parar de pensar do Geral para o Particular, de Universais para Singularidades. As grandes soluções impossíveis amarram as possíveis. Temos de encerrar reflexões dedutivas e apostar no indutivo. O discurso épico tem de ser substituído por um discurso realista, possível e até pessimista. O pensamento da velha “esquerda” tem de dar lugar a uma reflexão mais testada, mais sociológica, mais cotidiana. Weber em vez de Marx, Sérgio Buarque de Holanda em vez de Caio Prado, Tocqueville em vez de Gramsci.

Não tem cabimento ler Marx durante 40 anos e aplicá-lo como um emplastro salvador sobre nossa realidade patrimonialista e oligárquica.

De cara, temos de assumir o fracasso do socialismo real. Quem tem peito? Como abrir mão deste dogma de fé religiosa? A palavra “socialismo” nos amarra a um “fim” obrigatório, como se tivéssemos que pegar um ônibus até o final da linha, ignorando atalhos e caminhos novos.

A verdade tem de ser enfrentada: infelizmente ou não, inexiste no mundo atual alternativa ao capitalismo. Isso é o óbvio. Digo e repito: uma “nova esquerda” tem de acabar com a fé e a esperança — trabalhar no mundo do não sentido, procurar caminhos, sem saber para onde vai.

No Brasil, temos de esquecer categorias ideológicas clássicas e alistar Freud na análise das militâncias. Levar em conta a falibilidade do humano, a mediocridade que se escondia debaixo dos bigodudos “defensores do povo” que tomaram os 100 mil cargos no Estado.

Além de “aventureirismo”, “vacilações pequeno burguesas”, “obreirismo”, “sectarismo”, “democracia burguesa,” “fins justificando meios”, “luta de classes imutável” e outros caracteres leninistas temos de utilizar conceitos como narcisismo, voluntarismo, onipotência, paranoia, burrice, nas análises mentais dos “militantes imaginários”.

Baudrillard profetizou há 20 anos: “O comunismo hoje desintegrado tornou-se viral, capaz de contaminar o mundo inteiro, não através da ideologia nem do seu modelo de funcionamento, mas através do seu modelo de des-funcionamento e da desestruturação brutal”, (vide o novo eixo do mal da A. Latina).

Sem programa e incompetentes, os neobolcheviques só sabem avacalhar as instituições democráticas, com alguns picaretas-sábios deitando “teoria” (Zizek e outros). Somos vítimas de um desequilíbrio psíquico. Muito mais que “de esquerda” ou “ex-heróis guerrilheiros” há muito psicopata e paranoico simplório. Esta crise não é só politica — é psiquiátrica.

Um comentário:

Unknown disse...


Quando critico o comportamento do político, em exercício ou não, na realidade estou criticando um ser social interagindo na sociedade que é o instituto da organização através do qual tentamos viver em harmonia. Mas este instituto atribui deveres e, ao mesmo tempo, restringe direitos a seres humanos que são parte de uma natureza com leis próprias, que não se subordina e é contrária às imposições da organização social.

De nada valerá a tentativa de convivência social em harmonia sem considerar esta verdade absoluta. Não serão a imposição de deveres e a restrição de direitos que limitarão a força do ser antropológico interagindo na natureza se ele é matéria e títere desta.

Embora a sociedade imponha a obrigatoriedade de sermos do bem o ser antropológico tanto pode ser anjo quanto demônio, não por sua vontade, mas por imposição. Ao mesmo tempo as forças do que chamamos de vida são, também, as do que chamamos de morte, sem considerarmos que na dimensão em que vivemos matéria não nasce nem morre!

Mas o que tem nos mantido como sociedade é a força da essência natural das inter-relações sociais, com seu equilíbrio entre as ações e as reações do ser humano, se constituindo como instrumento da harmonia social. Eis a razão porque deveríamos exigir que o político tivesse essa compreensão e assumisse, de vez, o papel de agente regulador dessa harmonia há muito renegada nas promessas das plataformas políticas.

Essa é a razão pela qual devemos nos conscientizar de que a plenitude harmônica de uma sociedade é uma utopia. Não podemos desperdiçar nosso tempo tentando transformar nossa sociedade em um Jardim do Éden. Em vez disso devemos nos concentrar na busca do necessário equilíbrio entre os instintos primitivos do ser antropológico e a lei natural que o rege, compatibilizando-o com o ordenamento do Estado. Mas está mais do que provado que não é privilegiando segmentos da sociedade, principalmente, quando ela se constitui como uma Autocracia apelidada de Democracia, que atingiremos a harmonia social.

Esta é a razão pela qual devemos ter em mente que a sociedade natural teve suas origens a partir da natureza orgânica do agente antropológico não do ordenamento dos estados constituídos, pois estes são, somente, invólucros das sociedades, exigindo que os agentes gestores desses estados devam se subordinar à sociedade não esta a eles.

Não podemos, em hipótese alguma, admitir a imposição da ambiguidade dominadora e “obscena” da trilogia ideológica: Esquerda, Centro e Direita no exercício político e esquecermos de que a tendência às políticas de objetivos sociais é polissêmica, apontando para todos os quadrantes desses interesses, aparentando uma contradição aos fundamentos naturais do desenvolvimento social, que tem como base a organização harmônica do Estado moderno”, mas essa polissemia nada mais é que a natureza do ser antropológico interagindo, ao mesmo tempo em que repudia o freio, mas suporta a moderação.

Ao longo da história, a maioria dos lógicos e pensadores sociais tiveram grandes ideias ou “ideias grandes”, mas isoladas e com objetivos personalistas, esquecida de que a sociedade natural se fundamenta em “princípios comuns” tendentes a se consolidar na sociedade moderna.

Foi esta distorção milenar que, até agora, abrigou os grandes equívocos da convivência social, onde prevaleceu o egocentrismo do ser humano com efeito contrário ao do agregador nas tentativas que se fez e faz em busca dessa harmonia, que só poderá ser alcançada a partir do ordenamento consuetudinário dos instintos primitivos do equilíbrio dessas forças antagônicas, que agregam e desagregam, mas que são próprias da natureza humana. Sem esse reconhecimento nunca obteremos a tão almejada paz social

Conclui-se, portanto, que cabe ao estado evoluído, quando constituído como lídimo representante da Sociedade Organizada, através do ordenamento, não permitir que o personalismo de seus agentes políticos se sobreponha ao interesse social polissêmico, condição para o equilíbrio dessa relação, que, ao se harmonizar, possibilitará o que tanto almejamos!